sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Revitalização de rios

A palavra revitalização passou a ficar conhecida do povo, com essa novela em que se transformou a transposição do rio São Francisco.[http://www.carbonobrasil.com/textos.asp?tId=108&idioma=1]
É a exigência dos ambientalistas, antes do início das obras de bombeamento e da construção dos canais e dutos nas bacias que serão beneficiadas. A maior preocupação ambiental é com a manutenção da vazão; secundariamente, com a qualidade das águas do velho Chico.[http://www.comciencia.br/reportagens/2005/02/04.shtml]

Disse atrás que o Brasil está sempre atrasado e na lanterninha da modernidade. Enquanto aqui nós vamos com a farinha, lá fora (nos países desenvolvidos), eles já vêm com o fubá pronto. Não que sejamos inferiores, mas por falta de oportunidades, de educação e de inovação. Assim está sendo com a revitalização dos nossos rios. Assista a este vídeo (de 4 min em banda larga) sobre a revitalização do rio das Velhas-MG.[http://www.tvcultura.com.br/reportereco/materia.asp?materiaid=176]

Na moderna concepção ecológica, revitalizar um determinado rio não quer dizer apenas acabar com a poluição de suas águas e recompor as matas ciliar e ripária. Tem a ver, principalmente, com as suas funções originais, com destaque para a sua geomorfologia. Dou um exemplo.

É comum nas áreas planas (como na Amazônia e na Baixada de Jacarepaguá, aqui no Rio de Janeiro), os rios apresentarem meandros (aquelas curvas sinuosas do leito). Por ocuparem áreas valorizadas, o homem, “inteligentemente”, se apressa em aterrá-las, reduzindo o rio a um canal artificial. Isso, realmente, resolve o problema da escassez de áreas (que podem ser usadas para edificações ou agricultura), mas criam sérios problemas ecológicos. Em alguns países evoluídos, os técnicos já estão tentando refazer as curvas originais, quando possível.[http://restoringrivers.org/]

Ecologia é o ramo da Biologia que trata das relações recíprocas dos seres vivos e destes com o ambiente. Do Grego Oikos = casa, habitat + Logos = estudo. O ambiente em geral limita a sobrevivência dos seres. A população de uma espécie, num dado momento, é determinada pela relação entre o potencial biótico (índice de reprodução) e a resistência ambiental. Obviamente, quando a resistência ambiental aumenta, a população diminui; quando essa resistência baixa, a população cresce. Assim, a ecologia dos rios nada mais é do que o estudo das interações dos seres vivos que habitam os rios (e seu entorno) e o meio ambiente.

Os seres vivos que habitam a comunidade biótica dos rios e adjacências são extremamente variados: peixes, anfíbios, insetos, répteis, pássaros, mamíferos, moluscos, caramujos, algas e plantas superiores. A resistência ambiental antes referida e que ameaça de extinção estas espécies, também é farta: barragens, mineração, esgotos, desmatamentos, aterros, urbanização, estradas, irrigação, agrotóxicos, indústrias, retificações e outras interferências do homem na paisagem natural dos rios.

No Brasil, infelizmente, cerca de 97% dos técnicos encarregados do estudo dos rios, são os Engenheiros Civis que, por formação, não levam em conta nos seus projetos, os aspectos ecológicos. Algumas vezes, por força de lei, são obrigados a terceirizar os Estudos de Impacto Ambiental – Relatório de Impactos sobre o Meio Ambiente, EIA/RIMA. Seria injustiça desconsiderar a grande contribuição que esses Profissionais já deram e vêm dando aos Estudos Hidrológicos, tendo sido os pioneiros na Hidrometria (medição das vazões dos rios), por exemplo.

Mesmo nos países desenvolvidos, como a Áustria, por séculos, os rios têm sido manipulados e regulados com um enfoque mais tecnológico do que ecológico. Como conseqüência, hoje há um grande número de rios mortos ou quase, incapazes de exibirem com vigor suas importantes funções naturais.

Pelo enfoque tecnológico, o rio nada mais é do que um canal natural, de onde o homem retira, de graça, água para: consumo, irrigação, indústria, etc., devolvendo-lhe esgotos e maus tratos. Pelo enfoque ecológico, o rio é um meio líquido onde (nele e à sua volta) se desenvolve uma comunidade biótica, com atributos físicos e químicos, que devem ser conservados ou, pelo menos, não tão maltratados pelo homem.

PRINCÍPIOS ECOLÓGICOS
Os princípios ecológicos que devem nortear qualquer interferência do homem (resistência ambiental) no meio aquático ribeirinho e na zona ripária (faixa de terra que margeia os rios) para que ocorra o tão desejado desenvolvimento sustentável, são os seguintes:
1. Preservar a qualidade da água
2. Manter a integridade física do rio
3. Proteger o habitat dos animais e vegetais

A qualidade da água do rio é função da sua pureza, aproximando-se e até mesmo ultrapassando, no seu trecho inicial, à qualidade da água da chuva. Normalmente, mesmo sem a interferência do homem, essa qualidade vai se deteriorando, à medida que o rio avança e quando as águas chegam à foz, já estão, de algum modo, poluídas. Qualquer ação humana, mesmo bem intencionada, que interfira no fluxo natural das descargas e que leve águas-servidas e sedimentos ao rio, vai invariavelmente interferir nos seus padrões de qualidade. A vegetação marginal tem uma função primordial na qualidade da água pois, além de servir como filtro para os sedimentos que chegam à calha vindos da zona ripária, por protegerem a superfície do rio (ou parte dela) dos raios solares, mantêm o teor de oxigênio dissolvido na água, e fornecem alimentos e refúgios, indispensáveis para a sobrevivência das espécies aquáticas.

Manter a integridade física de um rio significa deixá-lo intocado, virgem, sem a interferência humana, como a maioria dos rios da Amazônia. Se bem que, mesmo ali, alguns já se acham contaminados por mercúrio, levado pelo ar, vento e chuva, de garimpos distantes.
Algumas feições naturais do rio são mais sensíveis às ações do homem, tais como: nascentes, várzeas, floresta ripária, pântanos, foz, ribanceiras e encostas elevadas, corredeiras e meandros. Essas características naturais e funções do rio devem ser preservadas de alguma forma, para proteger a integridade ecológica e para melhorar a conectividade entre os habitats dos animais silvestres. Como é impossível a urbanização sem ferir a integridade física do rio, as obras de engenharia como os diques de proteção contra enchentes, por exemplo, deveriam ser minimizadas, dando-se prioridade à retenção natural das águas, a restauração dos alagados ripários e às áreas de infiltração, para diminuir os volumes das enxurradas. Do mesmo modo, devemos evitar: as retificações dos meandros; a construção de moradia nas várzeas (margens); os pisos totalmente impermeáveis; os desmatamentos e os aterros de manguezais, etc.

Proteger o habitat dos animais e vegetais não é função apenas dos chamados de “eco-chatos”; é uma questão de soberania e inteligência. As várzeas, por exemplo, estão entre os mais diversificados habitats do mundo. O fluxo natural das águas determina o número e o tipo de habitats que existem no rio e em suas margens; é importante como fonte de alimento, locais de desova e recria e rotas de migração de animais silvestres, peixes e outras espécies aquáticas. As cheias naturais são a chave para a manutenção da integridade ecológica dos ecossistemas dos rios. Devemos conhecer a ecologia do rio, incluindo o seu passado histórico. Essas considerações incluem as características da área por ele drenada (a bacia), as várzeas, o percurso, os seus tipos únicos de habitats, a estrutura de seu leito e margens; os seus níveis d´água e descargas (Hidrologia), química da água e as necessidades biológicas de sua fauna (peixes, insetos, anfíbios, répteis, pássaros e mamíferos). Também é importante compreender como a estrutura do rio vem sendo alterada e como ela pode ser mudada no futuro.

Nos acostumamos a pensar que tudo o que ocorre de errado do lado de fora da nossa porta é problema do Governo; o acúmulo de lixo, os buracos nas ruas e os rios poluídos. Em parte isso é verdade, vez que pagamos impostos para quase tudo. Por outro lado, cada vez mais, cresce a participação da sociedade na solução de problemas que até há pouco “não eram da nossa conta”, como o combate à fome, a denúncia anônima, a adoção de crianças e o trabalho voluntário.

Fica patente, portanto, a seguinte situação: estamos rodeados de problemas que o Governo não consegue resolver mas que, se nós quisermos, podemos dar a nossa parcela de contribuição. Mas, para isso, precisamos conhecer o problema.

Por que os rios estão poluídos ?
Herdamos dos nossos colonizadores a cultura do desperdício. Se a Prefeitura não vem à nossa porta apanhar o lixo, é mais fácil jogá-lo pela janela, no valão mais próximo. É mais ou menos assim que fazemos com os nossos esgotos (domésticos e industriais), florestas, agrotóxicos e tudo o que é descartável. Os agricultores, na maioria das vezes por desconhecimento, usam técnicas agrícolas equivocadas (plantio morro-abaixo, solo desprotegido da chuva, monocultura, etc.), que levam toneladas de terra fértil para os rios, carreados pelas chuvas, assoreando-os e contaminando-os. As principais causas da degradação dos nossos rios são pois: o lançamento de esgotos sem tratamento, a erosão dos solos e o desmatamento.

Como podemos ajudar
Quem vive nas cidades (a maioria dos brasileiros) tem menos chances de ajudar na despoluição dos rios, uma vez que, na maioria das vezes nem os vemos, pois estão canalizados e concretados sob os nossos pés. Na periferia das cidades, onde os rios são verdadeiros canais de esgoto, ajudariam muito se, ao menos, não se construíssem barracos em suas margens e não jogassem lixo no seu leito. Por outro lado, os citadinos têm mais recursos do que os campesinos para promoverem a Educação Ambiental em larga escala.
Os que moram no campo, por estarem mais em contato com os rios, têm maiores responsabilidades com a sua recuperação. Entre as medidas práticas mais eficazes, relacionamos os seguintes:[http://www.therrc.co.uk/manual.php]
a) proteção das nascentes e matas ciliares;
b) conservação do solo e da água;
c) adoção de técnicas de irrigação localizada e do plantio-direto;
d) cobertura do solo com restos de cultura e adubação orgânica;
e) construção de bacias de infiltração da água da chuva ao longo e às margens das estradas vicinais; e
f) outros (vide link acima).

O que esperar do futuro
As ações de revitalização dos rios são comuns nos países desenvolvidos, desde a década de 60. O Brasil ainda está engatinhando nessa matéria mas, se quisermos, poderemos recuperar o tempo perdido através de técnicas limnológicas, como aquelas usadas pioneiramente pela Universidade de São Carlos – SP. O rio Mogi-Guaçu, por ex., que banha os estados de Minas Gerais e São Paulo, foi alvo, anos atrás, desses estudos. Foram pesquisados parâmetros físicos, químicos e biológicos da água e dos sedimentos desse rio, chegando-se à conclusão que, como a maioria dos rios brasileiros, ele está agonizante.[http://www.ufrrj.br/institutos/it/de/acidentes/baciaurb.htm]

Desse modo, meu amigo, se você quer ser um Gestor Ambiental competente, além de Ecologia, tem de estudar um pouco mais sobre Hidrologia[http://www.profrios.hpg.ig.com.br/].

ESTUDO SUPLEMENTAR
1 – Tópico sobre Revitalização de Rios.[http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm=58825&tid=5845752]
2 – Capítulo sobre Limnologia na página sobre Riscos de Acidentes.[http://www.ufrrj.br/institutos/it/de/acidentes/index.htm]
3 – Manual inglês sobreRevitalização de Rios.[http://www.therrc.co.uk/publications.htm]
Dentre os vários enfoques requeridos pela Gestão Ambiental, a Gestão das Águas é, sem sombra de dúvida, a mais importante, pois ela tem a bacia hidrográfica como o palco de ação.[http://www.orkut.com/CommMsgs.aspx?cmm=58825&tid=23336126]

E já que falamos em Revitalização de Rios, vamos emendar o assunto com a chamada Gestão dos Recursos Hídricos, tratada na Lei das Águas (No 9.433/97). [http://www.ana.gov.br/GestaoRecHidricos/PlanejHidrologico/default.asp]

Por essa lei, qualquer interferência antrópica (do homem) nos mananciais, sejam de superfície ou subterrâneos, deve seguir as diretrizes governamentais. Foi-se o tempo em que uma única propriedade agrícola podia até secar um córrego com suas bombas de irrigação (deixando os demais a ver navios) ou uma indústria matar toda a fauna de um rio com os seus dejetos. Agora, tudo é regulado pelo Plano Diretor de Recursos Hídricos - PDRH. Entre 1997 e 2002, eu participei da elaboração de quatro Planos em rios do Nordeste.

Segundo dados da Revista Agroanalysis (ed. março de 1998, p.29), da água retirada de um rio, cerca de 70% vai para a atividade agrícola (irrigação, principalmente), 23% para as indústrias apenas 7% para o consumo humano. O PDRH disciplina essa disputa e delineia cenários de curto, médio e longo prazos para o uso sustentável dos recursos hídricos.

Em síntese, o Brasil copiou da França a sua política de gerenciamento de recursos hídricos, que criou os Comitês de Bacias (do rio Paraíba do Sul, Piracicaba, São Francisco e outros, p.ex.), disciplinou a outorga de uso e a cobrança pelo uso da água. O Comitê do rio Pardo, p.ex., é bastante atuante e eu cheguei mesmo a colaborar com ele, escrevendo alguns artigos técnicos em seu Boletim.[http://www.comitepardo.com.br/]

O Programa Desenvolvimento Sustentável em Debate, que vai ao ar toda 6a.feira, das 12 às 13 h, apresenta uma série de palestras relacionadas ao meio ambiente e gestão ambiental.[http://www.ea.ufrgs.br/eatw/dsd.asp]

À propósito, assisti ao vídeo Gestão ambiental nas regiões metropolitanas, do professor José Carlos da Silva Filho, que fez o doutorado na Alemanha e discorre o livro que escreveu sobre a gestão das águas no
Rio Grande do Sul.[http://www.ea.ufrgs.br/eatw/video_acervo.asp?caminho=eatwacervo2005/dsd/dsd_20051202.wmv]

E também, Uma visão integrada para o uso da água do ambiente, palestra proferida dia 24/03/06, pelo Professor Sérgio Brião Jardim, da PUCRS.[http://www.ea.ufrgs.br/eatw/video_acervo.asp?caminho=eatwacervo2006/dsd/dsd20060324.wmv]

Autoria: José Luiz Viana do Couto
e-mail: jviana@openlink.com.br

Um comentário:

Eduardo Miguel disse...

- Mais uma vez o problema no mundo não é "O QUE" mas "COMO" lidamos com os fatos, as regras, os elementos a vida!!! não é o lixo não são os resíduos não são os produtos químicos ou o côcô o verdadeiro problema e sim onde os depositamos, conhecer o problema não basta é preciso educação e ação por isso você, eu e outros ideologistas trabalhamos construindo um novo posicionamento a formar opnião na quebra de paradgmas que definirão os rumos do futuro da sociedade e do mundo.
- Parabéns pelo trabalho!

http://eduardomiguelpardo.fotoblog.uol.com.br