sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Brasil importa agrotóxico vetado no exterior

Até julho, país importou mais de 6.000 toneladas de substâncias que foram proibidas nos próprios países onde são produzidas.
Segundo a OMS, esses produtos podem causar problemas no sistema nervoso, câncer e danos ao sistema reprodutivo. Enquanto a Justiça proíbe a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) de fazer a avaliação toxicológica de agrotóxicos comercializados no país, o Brasil já importou, até julho deste ano, mais de 6.000 toneladas de substâncias que foram vetadas pelos próprios países que as produzem. Essas substâncias são usadas para fabricar cerca de cem agrotóxicos utilizados em culturas de frutas, feijão, grãos, batata e café, entre outros.

Entre os possíveis efeitos decorrentes da ingestão dessas substâncias, apontados pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e pelas agências da União Européia e dos Estados Unidos, estão problemas no sistema nervoso, câncer e danos ao sistema reprodutivo. Os mais afetados são os trabalhadores da agricultura, que manipulam diretamente os produtos. Especialistas afirmam que há também risco para o consumidor dos produtos agrícolas. No entanto, ressalvam que, muitas vezes, é difícil estabelecer um nexo causal entre a substância e a doença.

Nos últimos anos, a evolução dos estudos levou outros países, principalmente da União Européia, a proibir determinados componentes dos agrotóxicos. Por causa do cerco internacional, a Anvisa decidiu reavaliar neste ano o registro de nove deles, que fazem parte da composição de 99 agrotóxicos. Em agosto, o processo foi suspenso por uma decisão liminar do juiz Waldemar Claudio de Carvalho, da 13ª Vara da Justiça Federal no Distrito Federal, em favor do Sindag (sindicato das indústrias de defensivos agrícolas). A entidade argumenta que o procedimento adotado pela Anvisa não dava aos fabricantes direito a ampla defesa.

José Roberto da Ros, vice-presidente-executivo do Sindag, afirma que alguns países podem cancelar o registro de algumas substâncias por terem encontrado um similar mais barato, e não por questões toxicológicas (leia nesta página).

Importações

Dados do Siscomex (Sistema Integrado de Comércio Exterior) registram um forte crescimento na quantidade de substâncias que o Brasil importa de países onde elas são proibidas, de 2006 em relação aos sete primeiros meses deste ano. Um exemplo do fenômeno é o paraquate, substância permitida para as culturas de abacate, abacaxi, algodão, arroz, aspargo, banana, batata, beterraba, cacau, café, cana-de-açúcar, chá, citros, coco, couve, feijão, maçã, milho, pastagens, pêra, pêssego, soja, sorgo, trigo e uva. O Brasil importava 82 toneladas do produto em 2006, ano em que ele foi proibido pela União Européia sob a suspeita de ser carcinogênico.

Em 2008, os registros até julho mostram que, hoje, o país compra uma quantidade 311 vezes maior. Entre os países que comercializam o produto estão Reino Unido e Dinamarca -a substância também é proibida no país nórdico. Outro caso envolvendo agrotóxico importado pelo Brasil ganhou espaço recentemente na imprensa dinamarquesa. Proibido naquele país desde 2005, o paration metílico voltou a ser exportado para o Brasil neste ano, após dois de interrupção. A Dinamarca, agora, estaria pressionando o fabricante pela aparente contradição.

"Eu tive a informação de que a Dinamarca estava exigindo que a empresa que produz o paration metílico retirasse a ação interposta na Justiça brasileira [contra a avaliação da Anvisa] porque lá eles não permitem a utilização desse produto", afirma Agenor Álvares, ex-ministro da Saúde e integrante da diretoria colegiada da Anvisa.

ANGELA PINHO - Folha de São Paulo

sábado, 23 de agosto de 2008

Conservação da biodiversidade em águas continentais do Brasil

INTRODUÇÃO
A preocupação com a biodiversidade no Brasil tem
crescido acentuadamente nas últimas duas décadas,
acompanhada pela proliferação de organizações conservacionistas
não governamentais e pela legislação
ambiental. Além disso, agências governamentais relevantes
consolidaram-se e expandiram-se, levando à
criação do Ministério do Meio Ambiente. Várias áreas
protegidas foram criadas desde o início dos anos 80 e a
mídia tem dado atenção crescente para a conservação
da vida silvestre.
Aproximadamente 14% das espécies do mundo são
encontradas no Brasil (Lewinsohn & Prado, 2002). Essa
extraordinária biodiversidade ainda é, no entanto, pobremente
conhecida. Para examinar essa afirmação,
realizamos uma inspeção da literatura sobre os artigos
científicos publicados entre 1990 e 12 de dezembro de
2004 na website do Institute for Scientific Information
(Thomson Corporation, 2005) com as palavras “Brazil
and biodiversity”. Como resultado, foram encontrados
apenas 217 trabalhos, um pequeno número que parece
ser típico de regiões neotropicais, exceto para aqueles
países que possuem grandes instituições de pesquisa
internacionais voltadas para estudos da biodiversidade,
como a Costa Rica e o Panamá.
Dentre os 217 trabalhos encontrados para o Brasil,
69% referiam-se especificamente a ecossistemas terrestres
e apenas 11% a ecossistemas de águas interiores.
O restante é relacionado a ambientes marinhos ou
biomas menores. Assim como ocorre com a biodiversidade
terrestre, os estudos com ecossistemas aquáticos
são fortemente direcionados para organismos de maior
porte, mais apelativos. Neste sentido não foi surpresa
observar que os peixes têm recebido a maior atenção.
Neste trabalho examinamos estimativas da riqueza
de espécies nos ecossistemas aquáticos continentais
brasileiros – lagos, lagoas, reservatórios, riachos, rios
e áreas alagáveis associadas – e listamos as espécies
ameaçadas. Também discutimos os principais perigos
para a biodiversidade aquática e algumas estratégias
para sua conservação.

DIVERSIDADE DE ESPÉCIES
O número de espécies nos ecossistemas aquáticos continentais
brasileiros ainda é impreciso e difícil de ser
estimado. Entre as dificuldades destacam-se o número
de bacias hidrográficas jamais inventariadas; a insuficiência
no número de pesquisadores e na infra-estrutura
necessária para amostragens; o reduzido número de
inventários efetuados; a dispersão das informações que
freqüentemente são de difícil acesso e a necessidade
de revisão taxonômica para vários grupos. A despeito
dessas considerações, os resultados apresentados na
Tabela 1, embora certamente subestimados, demonstram
alguns padrões interessantes. Por exemplo, as
águas continentais brasileiras são extraordinariamente
ricas para alguns grupos como algas (25% das espécies
do mundo), Porifera (Demospongiae, 33%), Annelida
(12%), Rotifera (25%), Cladocera (Branchiopoda, 20%) e
Decapoda de água doce (10%). Revisões recentes de
parasitas de organismos aquáticos, especialmente peixes,
têm revelado uma grande diversidade (650 espécies)
e este número considera apenas os platelmintos
(Monogenea, Digenea e Cestoda), acantocéfalos e
nematóides (Takemoto et al., 2004 e referências por ele
citadas).
O Brasil também lidera o número de peixes de água
doce, possuindo 2.122 espécies catalogadas (cerca de
21% das espécies do mundo; Buckup & Menezes, 2003).
Bacias hidrográficas isoladas podem apresentar elevado
endemismo; por exemplo, 60% das 75 espécies de
peixes do rio Iguaçu são endêmicas. Provavelmente
30 a 40% da fauna de peixes neotropicais de águasinteriores ainda não foram descritas e, assim, um número
mais realista para as águas brasileiras pode ser
de 5.000 espécies (Reis et al., 2003). Schaefer (1998)
afirma, baseado em tendências históricas de descrição
de espécies, que esse número pode ser de 8.000. O
número estimado apenas para a região amazônica é de
2.000 espécies (Winemiller et al., 2005). Aproximadamente
400 novas espécies de peixes são descritas a cada
década em águas continentais e Vari & Malabarba (1998)
consideram um eventual aumento de 50% na riqueza
de peixes do mundo (aproximadamente 33.000 espécies).
Os peixes neotropicais (8.000 espécies) contribuiriam
com 24% desse total. Os peixes neotropicais representam
13% da biodiversidade total de vertebrados,
embora ocorram em menos de 0,003% (por volume) dos
ecossistemas aquáticos do mundo. Além disso, há 732
espécies de anfíbios no Brasil (aproximadamente 13%
das espécies descritas no mundo), a maioria das quais
com um estágio obrigatório de sua vida em ambientes
aquáticos continentais (IUCN et al., 2004).

NÚMERO E DISTRIBUIÇÃO DE ESPÉCIES AMEAÇADAS

A lista de espécies ameaçadas da fauna brasileira apresentada
pelo Ministério do Meio Ambiente (Instrução
Normativa 3, de 27 de maio de 2003 e Instrução
Normativa 5, de 21 de Maio de 2004) inclui 44 invertebrados,
134 peixes e 16 anfíbios (Tabela 2). Dentre os
invertebrados, a maioria das espécies criticamente
ameaçadas pertence aos Porifera: Corvoheteromeyenia
e Racekiela, no estado do Rio Grande do Sul e
Corvospongilla no estado da Paraíba (todos Spongillidae).
Conforme demonstrado na Tabela 2, 33 espécies de
peixes (Osteichthyes) encontram-se criticamente ameaçadas.
A maioria delas é Cyprinodontiformes, pertencente
à família Rivulidae e gêneros Leptolebias (seis
espécies nos estados da Bahia e Rio de Janeiro) e
Austrolebias (três espécies no Paraná e Rio Grande do
Sul). Espécies de Characiformes criticamente ameaçadas
incluem membros dos gêneros Brycon (Minas Gerais,
São Paulo e Rio de Janeiro), Hasemania (Paraná),
Henochilus (Minas Gerais) e Hyphessobrycon (três espécies
em Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro).
Gêneros de Siluriformes incluem Steindachneridion (três
espécies em Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro),
Pogonopoma, Delturus (ambos em Minas Gerais e
Rio de Janeiro) e Harttia (Rio de Janeiro). Os Perciformes
são dos gêneros Crenicichla e Teleocichla, ambos no Pará.
Todos os estados brasileiros têm pelo menos uma
espécie de invertebrado aquático ameaçada, sendo a
maioria encontrada nos estados do Rio Grande do Sul
e São Paulo. Quando analisadas por região, as diferenças
no número de espécies de invertebrados listadas
são marcantes: 25 no Sul, 23 no Sudeste, 10 no Nordeste,
8 no Norte e 9 no Centro-Oeste. Para os peixes, por
outro lado, apenas 14 estados têm espécies listadas e a
maioria é encontrada no Sudeste e Sul, especificamente
nos estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro
e Rio Grande do Sul. Isto pode ser o resultado de
vários fatores: (1) o Sudeste e Sul são as regiões mais
desenvolvidas do país e, em decorrência disso, os ecossistemas
aquáticos têm sofrido os maiores impactos;
(2) a maioria dos cientistas que estudam organismos
aquáticos encontra-se nessas regiões e, como resultado,
os registros de espécies ameaçadas também é maior
e (3) há muitas espécies endêmicas de distribuição
restrita nessas regiões.
A sobrepesca, ou a pesca próxima disso, tem ameaçado
as populações de várias espécies de peixes, o
que levou a considerá-las como ameaçadas de sobreexploração.
Entre estas se destacam o tambaqui
(Colossoma macropomum [Characidae]) e os e jaraquis
(Semaprochilodus spp. [Prochilodontidae]) da bacia Amazônica
e pimelodídeos migradores como a piramutaba
(Brachyplatystoma vaillantii [Amazônia]), piraíba (B.
filamentosum [Amazônia]) e jaú (Zungaro zungaro [de
ampla distribuição]).

AS PRINCIPAIS AMEAÇAS PRESENTES E FUTURAS

As principais causas da perda direta da biodiversidade
em ecossistemas aquáticos continentais brasileiros são
poluição e eutrofização, assoreamento, construção de
barragens e controle de cheias, pesca e introdução de
espécies. As ameaças aos ecossistemas aquáticos variam
consideravelmente em número e importância de
acordo com as diferentes regiões do Brasil, a densidade
populacional humana, os usos do solo e as características
socioeconômicas predominantes. Tundisi (2003)
discute as principais ameaças para a biodiversidade
aquática, por região: (1) tratamento inadequado da água
(especialmente no norte); (2) grandes áreas urbanas,
indústrias e agricultura (Sudeste); (3) agricultura, indústrias,
irrigação e aqüicultura (Sul); (4) escassez de água
(Nordeste) e (5) desmatamento, construção de canais e
hidrovias, pesca predatória e pecuária intensiva (Centro-
Oeste, incluindo o Pantanal). A essa lista, adicionamos
a construção de barragens e tratamento inadequado
de esgotos (menos de 30% do esgoto é tratado) em
todas as regiões do Brasil.
72 | Conservação da biodiversidade em águas continentais do Brasil

Uma preocupação especial é a de que a prosperidade
econômica regional não implica necessariamente
no aumento de investimentos para melhoria da qualidade
da água e na conservação dos recursos aquáticos
naturais (Martinelli et al., 2002). As maiores ameaças
à biodiversidade aquática estão nas regiões mais desenvolvidas.
A seguir discutiremos algumas situações
que ilustram a perda da biodiversidade aquática associada
ou diretamente ligada a essas ameaças.
Perdas de espécies e/ou alterações da estrutura de
comunidades têm sido associadas com poluição e eutrofização
de riachos e rios (Marques & Barbosa, 2001;
Martinelli et al., 2002), reservatórios (Pinto Coelho,
1998; Tundisi & Matsumura-Tundisi, 2003), lagoas
(Esteves et al. 2002) e lagos (Barbosa et al. 1993), especialmente
em regiões com altas densidades populacionais
humanas, tais como São Paulo (Martinelli et al.
2002). Um acentuado decréscimo da biodiversidade por
essas razões tem sido documentado até mesmo na
Amazônia, nas imediações de Manaus (Cleto Filho,
2003).
O assoreamento é problema em um grande número
de bacias hidrográficas brasileiras e vem ampliando-
se pela expansão das fronteiras agrícolas. Efeitos
sobre a biodiversidade têm sido documentados no Pantanal
(Mourão et al., 2002) e, para macroinvertebrados,
em riachos do Cerrado (Wantzen, 2003), da Mata
Atlântica (Buss et al., 2004) e da Amazônia (Callisto et
al., 1998).
Mais de 600 barragens (40.000 km2; volume de 6,5 x
1011m3) foram construídas no Brasil, principalmente para
produzir eletricidade (A. Agostinho, dados não publicados).
Barragens, que interrompem os movimentos de
peixes potamódromos, são possivelmente o principal
fator que afeta a abundância de espécies migradoras
(reprodução e fragmentação de hábitats). A biodiversidade
de planícies de inundação a jusante das barragens
é também afetada pelo controle do regime de cheias
através da redução das áreas de planície alagada,
retenção de nutrientes e alteração nos hábitats proporcionada
pela erosão (Agostinho et al., 2004b). A
montante das barragens, os impactos dependem das
características do reservatório (localização, morfometria,
hidrologia), desenho da barragem, procedimentos
operacionais, descarga, tipos de solo e interação com
outras barragens. Em geral, extinções locais e alterações
abruptas da estrutura das comunidades ocorrem
como resultado de mudanças no tempo de retenção e
qualidade da água. Os novos projetos de barragens, que
deverão piorar a já precária situação da biodiversidade
aquática, estão concentrados na bacia amazônica e em
riachos menores espalhados por todo território brasileiro.
Os maiores rios fora da Amazônia têm suas possibilidades
de aproveitamento hidrelétrico virtualmente
esgotadas.
Introduções de espécies resultam em grandes impactos
sobre a biodiversidade dos ecossistemas aquáticos.
Introduções de peixes, tanto de espécies nativas como
exóticas, são comuns no Brasil e resultam da irresponsabilidade
de parte do pessoal envolvido com a pesca
recreativa, estocagem e aqüicultura. Levantamentos
realizados na bacia do rio Paraná (51 locais; 2.100 amostragens)
revelaram que piscívoros da Amazônia são
os que alcançam maior sucesso nessas introduções.
As introduções de espécies de peixes também alcançam
maior sucesso em corpos de água com elevado
grau de endemismo e naqueles regulados por barragens
(A. Agostinho et al., dados não publicados). No
sistema de lagos naturais do Parque Estadual do Rio
Doce, Minas Gerais, a riqueza de espécies de peixes
declinou em todos aqueles nos quais houve introduções,
nos últimos 50 anos (Godinho, 1996).
Invasões por invertebrados bentônicos têm também
causado sérias conseqüências. Dois bivalves invadiram
as águas brasileiras nas últimas duas décadas – o
berbigão-de-água-doce (Corbicula fluminea) e o mexilhãodourado
(Limnoperna fortunei) (Darrigran & Drago, 2000;
Takeda et al., 2004). C fluminea já foi registrado até mesmo
na Amazônia (Beasley et al., 2003) e no Pantanal
(Callil & Mansur, 2002). O rio Paraná tem sofrido declínios
nas populações de várias espécies nativas de bivalves
simultaneamente ao aumento das densidades de
C. fluminea (Takeda et al., 2004).
Duas gramíneas introduzidas (Panicum repens L. e
Brachiaria subquadripara [Trin.] Hitchc.) invadiram o Pantanal
(Pott & Pott, 2003) e reservatórios da bacia do rio
Paraná, dominando espécies nativas. Considerando-se
o importante papel das macrófitas aquáticas para a
manutenção das comunidades de peixes e invertebrados
aquáticos, essas introduções podem ter sérias conseqüências
para as comunidades aquáticas dessas áreas

INICIATIVAS DE CONSERVAÇÃO E PESQUISA
A conservação da fauna e flora terrestres tem sido a
principal razão para o estabelecimento da maioria das
áreas protegidas nas ultimas três décadas. No Brasil,
muitas dessas áreas também protegem corpos d’água
e importantes áreas alagáveis, porém suas faunas terrestres
e aquáticas têm sido pouco estudadas, ou mesmo
inventariadas. Dados recentes mostram que apenas
5% das áreas protegidas dos trópicos foram inventariadas
para um ou mais grupos de organismos
(Hawksworth, 1995).
Áreas protegidas nas quais os organismos aquáticos
têm sido intensamente inventariados demonstram a
importância desse esforço para a conservação da biodiversidade.
Em levantamentos realizados em menos
de 10% da área de proteção ambiental da Planície de
Inundação do Alto Rio Paraná (526.000km2; 0,4% do
bioma Mata Atlântica), por exemplo, foram encontrados
50% das espécies de peixes e 6% dos anfíbios
registrados para todo o bioma (Agostinho et al., 2004b)
e 58% dos anelídeos (Takeda et al., 2004), 50% dos
rotíferos, 49% dos cladóceros, 40% das tecamebas
(Lansac-Tôha et al., 2004), e 8% das algas (Train & Rodrigues,
2004) registrados para o Brasil. Estes dados revelam
a elevada riqueza de espécies da bacia do rio Paraná
ou, mais provavelmente, a falta de levantamentos equivalentes
nas demais áreas do Brasil. Desta maneira, o
conhecimento da biodiversidade de água doce nas unidades
de conservação brasileiras e o entendimento da
distribuição dessa biodiversidade são desafios prioritários para a próxima década.
O manejo dos recursos aquáticos, em especial peixes,
é geralmente oportunista e baseado em informações
técnicas e científicas inapropriadas (exceções
notáveis incluem algumas iniciativas isoladas na
Amazônia; Ruffino, 2004). Historicamente, as ações de
manejo incluem o controle da pesca, estocagem e construção
de escadas para transposição de peixes (escadas
de peixes) (Agostinho et al., 2004a). O controle da pesca
procura regular a captura de peixes jovens (comprimento
mínimo de captura e tamanho mínimo de malha)
e proteger locais de desova durante o período
reprodutivo. Porém, essas medidas são comprometidas
pela falta de informações sobre as populações de peixes,
de recursos financeiros e pelo limitado poder de
fiscalização.
As razões para as estocagens jamais foram claras (tais
como remediar a sobrepesca ou promover melhorias
na qualidade genética). Em geral, os esforços de estocagem
são “decorativos”, visam ganho eleitoral – tiram
proveito, por exemplo, das aspirações recreativas de
comunidades locais ou seguem uma prescrição equivocada
de reparação de danos ambientais (formação de
reservatórios ou poluição ocasional). Não existem no
Brasil estocagens sistemáticas, baseadas em informações
científicas e procedimentos básicos como a avaliação
dos riscos e estimativas da capacidade de suporte
são ignorados. Na maioria das vezes em que as
introduções ou transferências foram feitas, os peixes
liberados jamais foram posteriormente recapturados
(Agostinho et al., 2004a). Freqüentemente, espécies inadequadas
são estocadas em número, idade e tamanho
incorretos. Além disso, os locais e a estação do ano de
liberação são também equivocados. Como resultado, a
maioria das tentativas falham.
Escadas de peixes também resultaram em insucesso
pois elas apresentam elevada seletividade e os movimentos
são essencialmente unidirecionais. Na bacia do
rio Paraná, algumas escadas permitem que os peixes
entrem em um reservatório, onde não existem locais
adequados para a reprodução ou áreas de crescimento,
quando os peixes seriam capazes de reproduzir em tributários
abaixo da barragem (Agostinho et al., 2002).
Desta maneira, ao invés de contribuir para a manutenção
das populações locais, algumas escadas de peixes
estão contribuindo para a extinção de espécies migradoras,
para a proteção das quais elas foram construídas.
O monitoramento dos resultados ou da eficácia das
ações de manejo é geralmente inadequado, ausente ou
conduzido por um curto período de tempo. Conseqüentemente,
numerosas técnicas de manejo inapropriadas
continuaram sendo empregadas durante muito tempo.
Mesmo atualmente, projetos, estratégias e ações para
a “melhoria” dos recursos naturais são baseados em
crenças e impressões (isto é particularmente verdadeiro
para três décadas de programas de estocagem e construção
de escadas de peixes). Um exemplo perfeito é a
recente iniciativa do Governo Federal no fomento do
desenvolvimento da aqüicultura em águas públicas (com
tanques redes) que, certamente, resultará na introdução
de espécies exóticas, dispersão de doenças e eutrofização,
esta última geralmente acompanhada por
altas densidades de algas, inclusive tóxicas.
Algumas lições importantes foram aprendidas com
as falhas no manejo de recursos aquáticos no Brasil.
Primeiro, o manejo da pesca tem que dar igual prioridade
para a produção de peixes e a manutenção da biodiversidade.
Segundo, as ações de manejo devem
enfatizar a integridade de habitats, principalmente nas
áreas críticas para o ciclo de vida das espécies existentes
na bacia, e a manutenção ou regulação apropriada
do regime de cheias. Terceiro, todas as ações de manejo
devem ser acompanhadas do subseqüente monitoramento.
Finalmente, a legislação e o controle da pesca
requerem comunicação eficiente, realismo e clareza
na definição de objetivos, bem como um amplo envolvimento
das organizações de pescadores. O público e
as partes interessadas devem ser alertados para o fato
que a pesca é, também, indicadora de mudanças ambientais
e, portanto, desempenha um papel vital na conservação
(Agostinho & Gomes, 2002).
Programas para a conservação da biodiversidade de
água doce do Brasil deveriam considerar o conceito de
espécies guarda-chuva, nunca aplicado em ecossistemas
aquáticos. Apesar da maioria das espécies guarda
chuva serem grandes mamíferos ou aves (Roberge &
Angelstam, 2004), candidatos da água doce incluem
alguns peixes migradores, que são altamente dependentes
da integridade de amplas áreas de uma bacia
(cabeceiras, canais principais e planícies de inundação
associadas). A pirarara (Brachyplatystoma vaillantii) e o
dourado (Salminus maxillosus) são bons candidatos devido
à popularidade em todos os tipos de pesca. A conservação
de determinados trechos de rios principais e
suas planícies de inundação (com base no conceito de
corredores aquáticos e no entendimento do ciclo de
vida de espécies chave, especialmente peixes), bem
como a manutenção da integridade hidrológica da região,
são fundamentais para a preservação da biodiversidade
de águas interiores do Brasil e a conseqüente
manutenção de seus recursos aquáticos.

ANGELO A. AGOSTINHO*
SIDINEI M. THOMAZ
LUIZ C. GOMES

Departamento de Biologia. Núcleo de Pesquisas em Limnologia, Ictiologia e Aqüacultura (Nupelia). Universidade Estadual de Maringá

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

CONCER desrespeita LEI Nº 9.065/98

MJ - DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL

SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

DELEGACIA DE POLÍCIA FEDERAL EM NOVA IGUAÇU


R E L A T Ó R I O


INQUÉRITO POLICIAL N.º: 630/2004-DPF.B/NIG/RJ.

INSTAURADO EM: 09 de novembro de 2004.

INCIDÊNCIA PENAL: Artigos 40 e 68 da Lei n° 9.605/98

INVESTIGADA: COMPANHIA DE CONCESSÃO RODOVIÁRIA JUIZ DE FORA - RIO


ILUSTRÍSSIMO SENHOR PROCURADOR,

O presente inquérito teve início com a Portaria n° 630/2004, de 09 de novembro de 2004, que, por sua vez, considerando o teor do Laudo Pericial n° 6769/04 do NUCRIM/SETEC/SR/DPF/RJ e demais documentos, resolveu apurar a eventual ocorrência de crime tipificado nos artigos 40 e 68, ambos da Lei n° 9.605/98 (fls. 02).

Às fls 07/11, Laudo Pericial n° 6.769/04 – SR/RJ o qual constatou, através do exame indireto, que os animais retratados, além de pertencerem a fauna silvestre da mata atlântica, constam na lista de animais protegidos e possivelmente morreram em decorrência de atropelamento.

Intimada a prestar esclarecimentos, compareceu à Delegacia de Polícia Federal em Nova Iguaçu a Srª. Márcia Fragoso Soares, então Coordenadora Ambiental da CONCER, a qual afirmou, sucintamente, que (i) “nunca tomou conhecimento, antes do inquérito, da ocorrência de atropelamento de animais”, (ii) “tem conhecimento que o local é o habitat de fauna silvestre protegida”, (iii) “que nos estudos realizados não foram constatados esse tipo de dano ambiental, causado por atropelamento de animais silvestres”, (iv) “admite que o atropelamento de animais silvestres é fato previsível, porém não nos índices”, (v) que “a rodovia já é dotada de dispositivos, para viabilizar a travessia dos animais silvestres entre a Reserva Biológica do Tinguá e a APA de Petrópolis” e (vi) que “as pertinentes placas de sinalização ainda não foram colocadas em razão de não haver um estudo que aponte para altos índices de atropelamento de animais silvestres”. (fls. 23/24).


Reinquirida, compareceu à Delegacia de Polícia Federal em Nova Iguaçu, a Srª Márcia Fragoso Soares, a qual afirmou, resumidamente, que (i) os “viadutos e bueiros são utilizados pelos animais para a travessia da rodovia”, (ii) “que vem sendo realizado estudo objetivando uma maior análise do problema”, (iii) “que acredita que ainda esse ano serão tomadas algumas providencias”, e (iv) “que vem sendo negociado um convênio com o IBAMA”. (fls. 40).

Às fls. 45/48, Proposta de Projeto, apresentado pela Concessionária, cujo objetivo, abreviadamente, consiste em identificar ações que reduziriam o número de atropelamento de animais silvestres na rodovia concedida.

Às fls.55 usque 110, Contrato de Concessão de Serviço Público precedida de obra pública entre a União, por intermédio do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem – DNER, e a Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora – Rio (CONCER).

Às fls 111/144, Relatório Semestral n° 01 – março/96 à agosto/96.


Às fls 145/280, Relatório Semestral n° 02 – janeiro/97 à dezembro/00.


Às fls 281/337, Relatório Semestral n° 03 – janeiro/01 à julho/01.


Às fls 339/512, Relatório Semestral n° 04 – julho/01 à dezembro/01.


Às fls 513/617, Relatório Semestral n° 05 – janeiro/02 à julho/02.


Às fls 619/690, Relatório Semestral n° 06 – julho/02 à dezembro/02.


Às fls 691/742, Relatório Semestral n° 07 – janeiro/03 à junho/03.


Às fls 743/792, Relatório Semestral n° 08 – julho/03 à dezembro/03.


Às fls 793/849, Relatório Semestral n° 09 – janeiro/04 à junho/04.

Às fls 850/912, Relatório Semestral n° 10 – julho/04 à dezembro/04.


CONCLUSÃO:


Inicialmente, cumpre analisar o art. 68, da Lei n° 9.605/98, o qual dispõe, in verbis:


Art. 68 - Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental:


Pena - detenção, de um a três anos, e multa.


Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa.

Cuida o presente tipo de norma penal em branco, uma vez que o comportamento proibido vem apenas enunciado, havendo necessidade de se recorrer à parte integradora para a completa subsunção da hipótese ao fato ocorrido.
Neste passo, o legislador estabeleceu como complemento da norma penal, obrigações descritas ou em outra norma legal, ou em contrato, hipótese que mais nos interessa.

Em análise do Contrato de Concessão de Serviço Público celebrado entre a União Federal e a CONCER, vislumbra-se, conforme seção XXX, item 176, a obrigação da Concessionária de enviar, ao DNER, semestralmente um relatório, com o intuito de satisfazer a política de proteção ambiental impingida. (fls. 89)

O dispositivo contratual referido, assim dispõe, a saber:


176. A CONCESSIONÁRIA enviará ao DNER, semestralmente, um relatório sobre:


a) os impactos ambientais provocados pela construção, conservação e exploração da RODOVIA;


b) as ações adotadas para mitigar ou compensar os efeitos dos impactos ambientais provocados;


c) os impactos ambientais previstos e (sic) a subseqüentes medidas de mitigação e compensação.


(os grifos são da transcrição)


Desta forma, sem muito esforço, extrai-se da cláusula em foco que a Concessionária, signatária do contrato, obrigou-se voluntariamente a enviar ao DNER estudos que, de acordo com o Princípio da Prevenção1, indicasse os impactos ambientais causados pela construção, conservação e exploração da rodovia concedida. Esses estudos, como natural, serviriam de base para adotar-se medidas ao menos mitigadoras ou compensadoras dos danos provocados.

Neste passo, é imperioso concluir que tal disposição contratual serve de complemento para o art. 68, da Lei n° 9.605/98 de forma a tornar o tipo penal aplicável. Portanto, nos termos da legislação ambiental, e tendo em
vista as obrigações contratuais assumidas pela Concessionária, esta incorrerá em crime contra a Administração Ambiental, caso deixe de enviar, dolosa (art. 68,
caput) ou culposamente (art. 68, parágrafo único), relatório que retrate os impactos ambientais provocados pela construção, conservação e exploração do objeto da concessão.
Da acurada análise dos relatórios enviados pela Concessionária (fls. 111/912) vislumbra-se que, apesar de se constatar a necessidade de prevenção de acidentes envolvendo a fauna, fato que se verificou mesmo durante as obras de implementação (vide, por exemplo, fls 286) absolutamente nada foi feito para reduzi-los. Omissão maior ainda se verifica pela completa falta de estudos sobre os danos causados à fauna durante a exploração da concessão.
Tais fatos são confirmados, posteriormente, pela Coordenadora Ambiental da CONCER, Drª Márcia Fragoso Borges, a qual, inquirida a depor, afirmou categoricamente, que sabe que o local explorado é
habitat de fauna silvestre protegida, e que mesmo assim, nenhum estudo foi realizado para atenuar tais danos.
Seria incoerente, ademais, admitir que o impacto ambiental causado pelo atropelamento da fauna silvestre protegida seja ínfimo, incapaz, desta forma, de causar qualquer dano ao meio ambiente. Em estudo feito pelo Instituto Terra Nova, anexado ao presente inquérito pela própria Concessionária, torna-se nítido o
relevante interesse ambiental que envolve a questão do atropelamento de animais da fauna silvestre. Confira-se excerto do Projeto (fls. 46), que aponta claramente a necessidade de se tomar medidas urgentemente, in verbis:
Por fim, também é importante ressaltar que a Lei n° 9.605/98 prevê, em seu art. 3°,
caput, a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, confira-se:


Art. 3° - As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nessa Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.


O dispositivo legal inovou o ordenamento jurídico, contrariando parêmia latina societas delinquere non potest1, ou seja, reconhecendo a possibilidade de se impor às pessoas jurídicas sanções penais.

Luiz Regis Prado, analisando o dispositivo citado, constatou que para a imputação de crime a pessoa jurídica é necessário “a) existência de infração penal; b) cometida por decisão do representante legal ou contratual da pessoa jurídica, ou de seu órgão colegiado; c) no interesse ou benefício da sua entidade”.2 Portanto, segundo o autor, preenchidos esses pressupostos, fica demonstrada a autoria do crime.

1 Muito embora alguns doutrinadores considerem tal dispositivo inconstitucional, o eg. Superior Tribunal de Justiça, em inúmeras oportunidades, considerou o dispositivo válido. Confira-se: Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n° 16.696/PR, Rel. Min. Hamilton Carvalhido. DJ 13/03/2006; Recurso Especial n° 610.114/RN. Rel. Min. Gilson Dipp. DJ 19/12/2005.

2 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 182.

Destarte, em primeiro lugar, resta configurada a infração penal ante a violação de dispositivo contratual de relevante interesse ambiental, como, aliás, foi exaustivamente demonstrado acima.
Também é evidente a conduta omissiva que deu ensejo ao descumprimento contratual. Mesmo reconhecendo a necessidade de preservação da fauna silvestre, seja durante a construção, conservação ou exploração da rodovia, a concessionária manteve-se inerte frente à morte de animais silvestres, vítimas de atropelamento.

Por fim, a omissão da concessionária em não empenhar recursos para estudos de preservação da fauna, repercute favoravelmente nos lucros da sociedade. Muito embora não tenha havido uma ação comissiva tendente a beneficiar a pessoa jurídica, sua reiterada omissão revela a despreocupação com a questão ambiental e com os animais mortos todos os dias, surgindo daí seu benefício, pois certamente é dispendioso evitar eficazmente a degradação da fauna local, através dos estudos de impacto ambiental exigidos pelo Art. 68 da Lei 9605/98.


Outrossim, com a não realização do estudo a CONCER se livrou da realização das medidas mitigadoras e/ou compensadoras pelo dano causado, as quais poderiam ser evidenciadas a partir do estudo que não foi realizado.

Da leitura da vasta documentação apresentada pela CONCER, não se verifica mais do que uma única frase, acerca do impacto ambiental provocado pelo mais do que previsível atropelamento de animais silvestres da fauna da mata atlântica.

A exploração da rodovia, portanto, contraria o papel social imposto pelo sistema normativo vigente.


DA RESPONSABILIDADE DAS PESSOAS FÍSICAS - REPRESENTANTES LEGAIS DA EMPRESA CONCESSIONÁRIA – CONCER.


No decorrer de todo o período de concessão, em atendimento ao disposto na Cláusula XXX, alínea “a” do contrato de concessão firmado (fl. 89), foram apresentados pela empresa vencedora da concessão, relatórios acerca dos possíveis impactos ambientais decorrentes do uso normal da rodovia.


O contrato foi assinado, pelos representantes da CONCER, na pessoa de seu Diretor Presidente e, bem assim, pelo Diretor de Operações.


Apesar de, como já dito anteriormente, terem sido previstos e apresentados relatórios nada de relevante foi apresentado, ou seja, nenhum estudo foi feito acerca da ocorrência de danos à fauna existente no local. Absolutamente nada foi feito pela empresa ou por seus representantes legais com o objetivo de minorar, ou pelo menos, avaliar a real dimensão dos danos causados.


Veja-se que o contrato, na cláusula retrocitada, fala claramente que:


  1. Os impactos ambientais provocados pela construção, conservação e exploração da rodovia;

  2. As ações adotadas para mitigar ou compensar os efeitos dos impactos ambientais provocados;

  1. Os impactos ambientais previstos e as subseqüentes medidas de mitigação e compensação.


Entretanto, analisando-se todos os relatórios apresentados, verifica-se que a única menção a danos à fauna é apenas às fls. 117, em relatório de obras informando sinteticamente que “os riscos adicionais de danos à vegetação e à fauna foram pequenos”, no decorrer das obras de manutenção e recuperação da rodovia.


Já os relatórios semestrais sobre proteção ambiental, encaminhados desde o início das operações da empresa concessionária, são todos praticamente idênticos, circunstância que prova não ter ocorrido durante todo esse período nenhum tipo de estudo sério sobre os danos ao meio ambiente, notadamente da fauna, mais especificamente sobre o grave e previsível problema do atropelamento de animais.


Todos os relatórios apresentados se limitam a sugerir a realização de um “Programa de Prevenção de Acidentes Envolvendo a Fauna” e só!!! Como confessado pela Gerente de meio ambiente da CONCER, nenhuma providência foi tomada, apesar da previsão contratual expressa, assinada pelos representantes legais da CONCER!!!


Nem mesmo placas solicitando cautela aos motoristas usuários da rodovia, em razão da travessia de animais silvestres, dignou-se a concessionária e seus representantes a providenciar.


Destarte, fica sobejamente demonstrada a responsabilidade criminal (Arts. 40 e 68 da Lei 9605/98) das pessoas físicas dirigentes, presentantes legais da empresa CONCER, nos cargos de Diretor Presidente e Diretor de

Operações, sendo essas pessoas, respectivamente: PEDRO ANTONIO JONSSON e RICARDO SALLES DE OLIVEIRA BARRA, conforme Ata de Reunião do Conselho de Administração de fls. 52.


Ante o exposto, tendo em vista que ficou totalmente comprovada a omissão de obrigação de relevante interesse ambiental pela Concessionária e seus representantes, obrigados, por força do Contrato de Concessão, a REALIZAR ESTUDOS sobre os impactos ambientais provocados pela exploração da rodovia, E TOMAR AS PROVIDÊNCIAS APTAS A MINORAR O DANO À FAUNA, resta comprovada a autoria e materialidade dos crimes contra o meio ambiente, previstos nos artigos 40 e 68, da Lei n° 9.605/98. Desta forma, findo a primeira fase da persecução penal, entendendo haver esgotado as diligências na esfera policial, submeto os presentes autos a V. Exª. para que, na qualidade de dominus litis, decida quais as providências cabíveis para a defesa dos bens jurídicos atingidos pela conduta criminosa sub examine.


É o relatório.


Nova Iguaçu/RJ, 27 de julho de 2006.


ALEXANDRE SILVA SARAIVA

Delegado de Polícia Federal



terça-feira, 19 de agosto de 2008

Como matar um rio

Um dos crimes ambientais mais comuns em qualquer curso de água são as barragens feitas na intenção de aumentar o nível do rio para que haja formação de uma "piscina natural", sobretudo qdo a qualidade da água é boa e capaz de sustentar uma fauna aquática diversificada e ao mesmo tempo especializada; como são a maioria dos organismos aquáticos da Mata Atlântica. Ao impedir o fluxo de peixes, plâncton, crustáceos á jusante e a montante condena-se qualquer riacho a um lento processo de asfixia biológica , pois muitos organismos reproduzem-se nas cabeceiras ou em locais mais abrigados.

Estes riachos são o lar de muitos peixes listados como "criticamente em perigo" ou "vulnerável", tais como os Trichomycteridae, Pseudopimelodidae, Sarcoglanidinae, Poeciliidae(Phalloptychus sp).

Numa análise supeficial pudemos constatar um crítico declíneo destas populações nas proximidades onde foi feito o registro fotográfico, embora a época do ano fosse propícia à observação destes peixes.

"Atitudes geram mudanças".

domingo, 17 de agosto de 2008

Imagens da Mata Ciliar Atlântica em Nova Iguaçu

Céu azul com fundo musical de incontáveis pássaros. Quais seriam?


" Água que nasce na fonte
Serena do mundo
E que abre um
Profundo grotão
Água que faz inocente
Riacho e deságua
Na corrente do ribeirão..."

" Águas que caem das pedras
No véu das cascatas
Ronco de trovão
E depois dormem tranqüilas
No leito dos lagos
No leito dos lagos..."

Letra: Guilherme Arantes


Somente aos olhos preparados um visão podem distinguir no caos da vida: Jardim de Eleocharis parvula em sua forma emersa.



Flagrante da vida animal da Mata Atlântica: pegadas de um ilustre desconhecido às margens do riacho


Acima: dois exemplos dos mais desconhecidos biótopos aquáticos tropicias: as coleções lacustres anuais ou temporárias. Enchem-se de água de acordo com o regime de chuvas da região e abrigam organismos que ainda têm muito a ensinar ao ser humano e sua tão limitada ciência.


Interessantíssimo inseto aquático cujo nome desconheço. Certamente não está ali por obra do acaso.


Lei de Lavoisier: "na natureza nada se cria, nada se perde - tudo se transforma". Outrora uma gigante da Mata Atlântica. Sucumbiu ao tempo dando oportunidade para que uma infinidade de formas de vida usufruam de sustentação.


O verdadeiro significado da cor amarela de nossa Bandeira Nacional: vida.

"Atitudes geram mudanças"

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

APA Guandu pode ter recursos de banco alemão

A disposição do banco de desenvolvimento alemão Kreditanstalt für Wiederaufbau (KfW) de ampliar os recursos repassados ao Brasil para proteção ambiental abre a possibilidade de implementação de projetos que são considerados estratégicos no estado.

Um dos destaques seria a implantação da Área de Proteção Ambiental do Guandu e nas regiões dos rios Piabanha, Estrela e Macaé, criada pelo governo fluminense.

A informação foi dada à Agência Brasil pela presidente do IEF - Instituto Estadual de Florestas do Rio de Janeiro, Yara Valverde. Ela acaba de voltar da Europa, onde manteve contato com dirigentes de órgãos governamentais e entidades não-governamentais da Alemanha e da Itália.

“É uma posição estratégica não só para o abastecimento de água para a população, mas também pela questão da biodiversidade da Mata Atlântica em si, porque ela fica justamente no ponto de conexão de dois fragmentos importantes da floresta, que são a Serra do Mar e a Serra da Bocaina”. Este projeto ainda não está incluído no PPMA/RJ

Segundo Yara Valverde, a primeira fase de implantação do projeto do Guandu está avaliada em R$ 6 milhões, envolvendo a área de proteção ambiental, sob a forma de parque fluvial, com recuperação de todas as margens dos rios, saneamento da bacia e reflorestamento em mais de cinco municípios, entre outras atividades.

As prefeituras já firmaram acordo de cooperação com o governo do estado. O projeto do Guandu conta também com a parceria de outras entidades, entre as quais a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, a Petrobrás, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis(Ibama).

Yara Valverde admitiu que o trabalho do comitê intermunicipal realizado na Alemanha para recuperação da bacia hidrográfica do rio Emscher, com 865 quilômetros quadrados e 85 quilômetros de extensão, poderá vir a ser adotada como modelo para a Área de Proteção Ambiental do Guandu. O comitê reuniu 12 cidades alemãs, além de confederações e associações comerciais e associações de moradores.

“O modelo do rio Emscher é exatamente o que a gente quer implantar aqui no Rio de Janeiro. Ele envolve a recuperação e uma gestão integrada da bacia, tanto na parte da política de conservação da biodiversidade, como na conservação dos recursos hídricos. É uma política integradora”, salientou. O projeto foi considerado o melhor da Alemanha em termos ambientais nos últimos anos.

Do mesmo modo, a presidente do IEF quer aproveitar a ampla experiência italiana na gestão de parques para a implantação do Parque Ambiental da Ilha Grande.

“A área foi duplicada no primeiro mês do governo Sérgio Cabral Filho e apresenta alto potencial para turismo e atividades de lazer e pode ser um fator de desenvolvimento para toda aquela região”.

Yara Valverde lembrou que os italianos têm larga experiência em parques, tendo sido pioneiros na criação da entidade de Guardas-Parques na Europa.

(Agência Brasil)


Pq não os ecólogos?

Por Marina Silva

A edição do Diário Oficial da União do dia 4 de agosto traz uma notícia boa e outra má. A boa nova é para os oceanógrafos: o projeto de lei que regulamenta sua profissão, aprovado pelo Congresso Nacional, foi sancionado pelo Presidente da República, transformando-se na Lei 11.760.

A má notícia veio para os ecólogos: o projeto de lei que regulamentava sua profissão, aprovado pelo Congresso Nacional no mesmo dia e na mesma sessão, foi vetado. Por que os oceanógrafos e não também os ecólogos, se ambas as profissões têm méritos e configuram campos reconhecidos de formação acadêmica e atuação profissional?

A Ecologia, ciência que estuda as interações dos seres vivos entre si e com seu meio físico, está definida em literatura desde o século XIX. Em 1870, o naturalista alemão Ernest Haeckel a conceituou pela primeira vez. Numa palavra, ele disse, "ecologia é o estudo das complexas inter-relações, chamadas por Darwin de condições da luta pela vida".

É fácil perceber a atualidade estratégica dessa ciência e a premência de profissionais da área, em tempos de adaptação da humanidade a situações-limite provocadas por intensa degradação ambiental. Entretanto, após tantos anos de luta, os ecólogos continuarão sofrendo restrições no mercado de trabalho, sem acesso ao pleno exercício profissional, por falta de regulamentação. É lamentável.

No Brasil, o primeiro curso de Ecologia foi criado em 1976, na UNESP de Rio Claro, no Estado de São Paulo. Hoje há seis cursos de graduação em todo o País e cerca de mil ecólogos formados. Isso sem contar os mestrados e doutorados existentes em várias universidades e institutos de pesquisa de ponta.

O veto, sugerido pelo Ministério do Trabalho e Emprego, alega que o projeto não prevê regras para a fiscalização da profissão, não define com exatidão o campo de atuação profissional específico e não estabelece quais outros profissionais poderiam compartilhar as mesmas atribuições definidas para o ecólogo.

A referência à ausência de definição do "campo de atuação profissional específico do Ecólogo" é, no meu entender, equivocada. O projeto deveria ser elogiado por não estabelecer reserva de mercado, ou seja, atribuições que só podem ser exercidas pelo ecólogo e por nenhum outro profissional.

Esse tipo de alegação esconde certo desconhecimento das atividades na área ambiental. O artigo primeiro do projeto refere-se à formação interdisciplinar como característica fundamental da profissão e esse conceito não é bem compreendido pelas áreas mais tradicionais de atuação.
Falta ao veto uma visão adequada da natureza da profissão de ecólogo e outras que pertencem a um universo de formação interativa e têm áreas mais extensas de superposição, porém, sem perder suas especificidades. Assim como a transversalidade é uma característica indispensável para a política ambiental, a interdisciplinaridade e a formação integradora são fundamentais para quem pensa, elabora e executa essa política.

Quanto às regras para a fiscalização do exercício da profissão, são uma questão atinente à regulamentação da Lei pelo Poder Executivo, através de Decreto a ser editado oportunamente pelo Presidente da República. O projeto original, em seus artigos 3º e 4º, atribuía essa responsabilidade ao Conselho Federal de Biologia. No entanto, esses dispositivos foram suprimidos na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, da Câmara dos Deputados, pois "após a promulgação da Emenda Constitucional n.º 32, tal conteúdo passou a ser de competência do Executivo, pela via do decreto, ou seja, não havendo despesas, nem mesmo se trata de matéria reservada à lei".

O veto dá a entender, ainda, que o projeto deveria estabelecer quais outros profissionais poderiam exercer cada uma das 13 atribuições listadas como não exclusivas do ecólogo. Seria excessivo e temerário fazê-lo. Qualquer esquecimento implicaria a supressão de atribuições de outros profissionais igualmente importantes.

O interessante é que ambos os projetos - o dos ecólogos e o dos oceanógrafos - não apontam um órgão fiscalizador, não definem com exatidão o campo de atuação profissional específico nem indicam as demais profissões que poderão exercer atribuições comuns. Para os oceanógrafos (e para muitas outras profissões já regulamentadas) essas questões não se constituíram em óbice à sanção. No caso dos ecólogos, serviram indevidamente de argumento para o veto.

Enfim, o veto à regulamentação da profissão de ecólogo foi um erro de repercussões muito negativas. Na área internacional, será difícil explicar porque um país com as características do Brasil trata tão mal um campo que deveria ser incentivado com prioridade. Imagino também o impacto que isso terá na disposição dos jovens em abraçar um ramo da ciência que lhes parece relevante e atraente, mas sequer recebe o abrigo de uma regulamentação profissional.

Caberá agora ao Congresso corrigir este equívoco. Aliás, está em tempo de o próprio Executivo reconhecer que errou e ajudar a encontrar a porta de saída.

Marina Silva é professora secundária de História, senadora pelo PT do Acre e ex-ministra do Meio Ambiente.

Fale com Marina Silva: marina.silva08@terra.com.br

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Dia da árvore - Lazer e reflorestamento

No último dia 22 de agosto o Grupo Ecológico Herdeiros da Natureza(GEHNat), diversas igrejas(católicas e evangélicas), escolas e demais instituições reuniram cerca de 500 pessoas na praça Marília Barbosa(Praça do caonze) para comemorar o "dia da árvore". O encontro ficou marcado como uma das maiores concentrações populares em defesa do meio ambiente já vista em Nova Iguaçu. A atividade foi subdividida em dois momentos, o primeiro com atividades de lazer, como capoeira(grupo de capoeira Serra do Vulcão), saúde bucal(secretaria municipal de saúde), exposição sobre reciclagem de lixo(cooperativa COOPCARMO), etc; e na parte da tarde foi realizada ação de reflorestamento onde inicialmente foram plantadas diversas mudas de pata-de-vaca.


Segundo Rejane, ativista ambiental e idealizadora do evento, é importante que se faça este modelo de atividade em todos os bairros de Nova Iguaçu dinamizando lazer e reflorestamento.

"Estou feliz, pois meu sonho vem dando frutos" disse. Já o Presidente do GEHNat Francisco Carvalho: "somos missionários do meio ambiente, por isso nos entregamos na realização deste evento" sentenciou.



Ações de caráter ambiental devem ser sinônimos de bem estar ára a população e cumprimos o que determina nossa consciência. Na foto um flagrante de saúde bucal com aplicação de flúor em grande número de crianças durante o evento.


Participaram também da organização do evento José Augusto, sec de meio ambiente(representando o Pref. Lindberg), toda assessoria do ver. Carlos Ferreira, o ferreirinha(PT), diversos representantes de entidades ambientalistas e comunitárias como Grupo de Teatro Florescer, UBEM, ERHEIM, onda verde, Prisioneiros da Liberdade, grupo efkaz, da assoc. moradores jaceruba(AMOJA), da comunidade evangélica Missionária CEM, Igreja Batista do Caonze, Paróquia do Sagrado Coração de Jesus, dentre outros.


Stand da COOPCARMO onde foi possível entrar em contato direto com a realidade da reciclagem. Notem que muitas coisas à mostra já fazem parte de nosso dia-a-dia.



Momento de lazer infantil com apresentação teatral de temática ambiental. Para quem assistiu a encenação garante que o texto embora simples em sua construção tratou o tema com rara seriedade.




Recomposição arbórea correta deve levar em consideração o bioma local. Na mostra várias espécies nativas da mata atlântica e suas sementes que posteriormente foram distribuidas entre os participantes.


Diretor-presidente: Francisco Carvalho(Chiquinho)
Texto/redação: Cosme Sigolis
Colaboradores: Aelson Rocha, Maria Cristina(Tininha), Adriana Lima, Marcos Sandes e Admailson Rocha
Equipe técnica: Sandro Marchausen, Yoshiharu Saito, José Castricini e Marcelo Lucas.


"Atitudes geram mudanças"

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Declaração universal dos direitos da água

Em 22 de março de 1.992 a ONU (Organização das Nações Unidas) instituiu o "Dia Mundial da Água", o qual vem sendo lembrado por entidades governamentais e não governamentais, como mais um dia mundial de luta em defesa da preservação da Natureza.

A ONU redigiu um documento intitulado "Declaração Universal dos Direitos da Água".

O texto merece profunda reflexão e divulgação por todos os amigos e defensores do Planeta Terra, em todos os dias e não apenas no 22 de março.

"Declaração Universal dos Direitos da Água"

1.-A água faz parte do patrimônio do planeta. Cada continente, cada povo, cada nação, cada região, cada cidade, cada cidadão, é plenamente responsável aos olhos de todos.

2.-A água é a seiva de nosso planeta. Ela é condição essencial de vida de todo vegetal, animal ou ser humano. Sem ela não poderíamos conceber como são a atmosfera, o clima, a vegetação, a cultura ou a agricultura.

3.-Os recursos naturais de transformação da água em água potável são lentos, frágeis e muito limitados. Assim sendo, a água deve ser manipulada com racionalidade, precaução e parcimônia.

4.-O equilíbrio e o futuro de nosso planeta dependem da preservação da água e de seus ciclos. Estes devem permanecer intactos e funcionando normalmente para garantir a continuidade da vida sobre a Terra. Este equilíbrio depende em particular, da preservação dos mares e oceanos, por onde os ciclos começam.

5.-A água não é somente herança de nossos predecessores; ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores. Sua proteção constitui uma necessidade vital, assim como a obrigação moral do homem para com as gerações presentes e futuras.


6.-A água não é uma doação gratuita da natureza; ela tem um valor econômico: precisa-se saber que ela é, algumas vezes, rara e dispendiosa e que pode muito bem escassear em qualquer região do mundo.

7.-A água não deve ser desperdiçada, nem poluída, nem envenenada. De maneira geral, sua utilização deve ser feita com consciência e discernimento para que não se chegue a uma situação de esgotamento ou de deterioração da qualidade das reservas atualmente disponíveis.

8.-A utilização da água implica em respeito à lei. Sua proteção constitui uma obrigação jurídica para todo homem ou grupo social que a utiliza. Esta questão não deve ser ignorada nem pelo homem nem pelo Estado.

9.-A gestão da água impõe um equilíbrio entre os imperativos de sua proteção e as necessidades de ordem econômica, sanitária e social.

10.-O planejamento da gestão da água deve levar em conta a solidariedade e o consenso em razão de sua distribuição desigual sobre a Terra.